Crônicas da Tia Jake: A vida do bigodudo

 No meu atual emprego trabalho com pessoas muito simples. São trabalhadores rurais, que na sua grande maioria não terminaram a quarta série. Isso pode parecer uma critica social, mas na verdade só estou contextualizando. 

Dentre os membros da equipe encontra-se um senhor de 60 anos, mais ou menos. Este senhor é o que podemos chamar de figura. Quem vê o semblante abatido, magro e corroído pelos anos se engana a primeira vista. Este senhor é uma das pessoas mais contraditórias e interessantes que conheci nos últimos tempos. 

Ele foi casado por 30 anos. Durante todo esse tempo traiu sua esposa, fumou e bebeu praticamente todos os dias. Sua esposa que lhe foi fiel e leal até o final. Chegando a marca dos 30 anos de casados, já cansada dessa história o chamou para conversar. Lhe perguntou: você vai deixar de fumar? Ele calmamente respondeu: Não! Ela prosseguiu: você vai deixar de beber? Ele mais uma vez respondeu que não. Por fim ela o questionou: você vai deixar de sair com a mulherada? Ele, com um sorriso no canto da boca, alisou o bigode e respondeu: Não. Ela então disse: eu quero a separação.

Desde então nosso herói (ou anti-herói) bigodudo está solteiro. Ele ainda não perdoou sua ex esposa por abandonar o casamento. Segundo ele, ela jurou no dia do casamento religioso que iria ser até que a morte os separe, de acordo com ele ela está vivendo em pecado, enfim, a hipocrisia. 

O bigodudo continua sua vida de conhaque e cigarro diário. Mas com a mulherada ele parou, na última vez que ele me falou sobre isso relatou não ter mais interesse nessa vida de promiscuidade. A partir daí podemos pensar em duas hipóteses, a primeira é que não tem graça sair com um monte de mulheres se não tem ninguém em casa para ser traída e a segunda é a idade. Eu deixo para você caro leitor escolher qual lhe apetece mais.

Atualmente este senhor vem sendo cortejado por uma outra senhora do trabalho. Devo admitir que essa relação estabelecida pelos dois é bastante distinta e interessante. Em nada se parece com as relações que eu estabeleço (até porque eu não sou o melhor exemplo de conquistadora da minha geração). O modo de flertar é muito mais sutil e lento. 

Essa semana mesmo eu ouvi do bigodudo: eu vou dobrar essa véia, tenho tempo, não preciso de pressa. Na segunda ele trouxe bolo para ela, na terça ela disse querer uma barra de chocolate, na quarta ele trouxe um bombom e um batom de chocolate, pois ele queria mostrar quem é que mandava na relação.

Na sexta ele tomou coragem e perguntou: a senhora é solteira? Ela respondeu: sou sim e estou em busca de um companheiro. Ele continuou: mas a senhora tem bens? Porque se tiver a gente marca de sair comer uma pizza, tomar um sorvete na praça! Ela respondeu que os únicos bens que ela possui são boletos e contas de água e luz. Ele finalmente concluiu: então vamos deixar esse sorvete pra outro dia. 

Atualização em outubro de 2021

Infelizmente o nosso amigo bigodudo faleceu em julho deste ano em decorrência do covid-19. Como tantas e tantos outros que perderam a vida nesse período. Deixo minha homenagem a ele e a todos os outros que partiram, estendo meu abraço fraterno a todos que perderam entes queridos.

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