Crônicas da Tia Jake: Viagem para Asilah

 Olá cara navegantes! Bem vindo ao muro das lamentações! Um lugar onde eu uso metáforas, ironias e rodeios para reclamar do que me acontece. A história de hoje é a minha aventura para chegar a Asilah sozinha. 

Durante minha estadia de 2021 em uma fazenda noMarrocos, eu tinha os finais de semana livres para sair, fazer o que eu quisesse, mas claro com toda cautela de alguém que está sozinha em um país onde a maioria das pessoas não fala nenhuma língua que você domina. 

Eu normalmente tinha companhia do meu amigo marroquino, mas nesse final de semana eu estaria sozinha. Ele então me sugeriu ir para Asilah, uma cidade litorânea que ficava voltada para o oceano Atlântico. Ainda era fora de temporada no Marrocos, ainda era março, mas isso não impedia que uma escapada para o litoral fosse uma boa ideia.

Para ir até Asilah eu teria que primeiro sair da fazenda onde eu estava, chegar no vilarejo, de lá pegar um Grand taxi (taxi para transporte de vários passageiros) com direção a cidade grande mais próxima que era Larache. Em Larache eu embarcaria em um ônibus, subiria em direção ao Norte do Marrocos, na cidade de Tanger de lá mais dois taxis até Asilah. 

Mas nesse final de semana eu tive sorte, o pai do meu amigo estava indo para a cidade e me deu uma carona. Enchi minha mochila de viagem, a mesma que me acompanha desde 2014 e fui! A minha ideia era em Larache comprar peixes no porto para levar para os meus amigos em Tanger. Mas eu fiquei com receio de ter que pegar taxi, ter que negociar e acabar perdendo o ônibus, optei por comprar água e algum doce para comer na viagem. 

A viagem de ônibus de Larache até Tanger dura uma hora, uma hora e meia. Eu sempre optava por uma companhia que era um pouco mais organizada e mais, meu amigo sempre me falava isso. Nesse dia eu optei por outra, porque não havia mais ônibus para o horário que eu queria e o próximo horário era tarde demais e eu chegaria a noite em Tanger. Logo depois de embarcar o arrependimento já bateu, a previsão era do ônibus sair as 15h30, eu subi as 15h10, o cobrador ficava gritando procurando mais passageiros, os passageiros entravam e saiam do ônibus, O horário de sair chegou mas o ônibus ainda não estava cheio, o cobrador continuava sua missão, nessa novela o ônibus saiu somente as 16h10. 

Larache
Obviamente o ônibus fez um trajeto mais longo do que o que eu era acostumada, obviamente ele fazia paradas intermináveis em qualquer ponto da estrada, assim como os ônibus pinga-pinga do nosso interior. Obviamente os bancos eram apertados para o meu tamanho, obviamente o passageiro ao meu lado parecia mal encarado. Assim, quase mijando nas calças cheguei em Tanger depois de três horas de viagem.

Ao chegar em Tanger eu devia pegar um taxi para me deixar no centro, o problema é que o a maioria dos taxistas de lá não falam e nem leem francês, e o nome do lugar que eu deveria ir era em árabe. Pedi para meu amigo me enviar um áudio de como pronunciar o nome do lugar para eu ir treinando na viagem. Obviamente não adiantou de nada e o taxista não entendeu, tive que mostrar no celular para que ele pudesse compreender. 

Ao chegar no centro, depois de dar muitas voltas, o que obviamente ele iria fazer para ganhar um pouco a mais, entrei em contato com meu amigo que me encontrou na avenida. Ele me perguntou como tinha sido a viagem, quanto custou o taxi, quando eu disse ele ficou muito bravo porque o taxista tinha me cobrado dez dihans a mais, (aproximadamente sete reais) e eu só pensando que pelo menos ele me trouxe no lugar certo... e que eu nunca mais diria o quanto paguei por nada no Marrocos para marroquinos. 

Chegando na casa do casal de amigos, a esposa dele não estava muito bem por causa de coisas que aconteceram na semana e ela foi direto para o quarto (alerta vermelho de confusão). Perguntei ao meu amigo como era a vista do prédio e se dava pra ver a Espanha do terraço, ele me levou lá e ficamos conversando enquanto eu fazia fotos que ficaram uma droga, mas enfim esse não é o ponto. A gente ficou batendo um bom papo sobre situação econômica do Brasil e do Marrocos, sim isso é um bom papo pra mim.       

A vista do telhado, aquele morrinho ali é a Espanha
 O tempo passou e ficar no terraço era uma boa porque eles costumam fumar dentro de casa, então em um ambiente aberto conversar com fumantes não é um problema. De repente meu telefone começa a tocar, era o número do meu amigo, ele atendeu porque sabia que era a esposa. Ela avisou que estava saindo, fomos até ela e aí a confusão se instaurou, ela teve uma crise de raiva. Não sei do que eles falaram, era tudo em árabe, só ouvia gritos, choro e coisas sendo arremessadas. Eu estava no quarto de hóspedes esperando a tempestade passar, o que demorou muito, foi aí que eu me agradeci por ter comprado chocolate a mais.

Passada a confusão, me chamaram pra jantar, eles agindo como se nada tivesse acontecido e eu ali fazendo meu papel de também fingir. Ajudei a preparar o jantar, alguma coisa queimou e o gás acabou. Mas estava gostoso. Eu participei de jantares mais constrangedores que aquele naquela casa, então estava tudo certo.

Eles foram dormir e eu fui ligar para o meu namorado contar tudo. No outro dia eu sairia bem cedo para Asilah, perguntei para meu amigo como chegar ao ponto do taxi, ele me explicou e falou, se a gente estiver acordado amanhã pode chamar a gente pra se despedir. Obviamente eu não iria chamar ninguém, queria sair o mais rápido possível, era o meu plano. 

Amanheceu o domingo, o céu lindamente azul, perfeito para meu passeio, levantei, juntei minhas coisas com cuidado (entenda-se joguei tudo dentro da mochila de maneira aleatória mas evitando fazer barulho), e me preparei para sair. Chegando na porta, ela não abria, procurei a chave e nada, lembra do plano de sair sem falar com ninguém? Falhou miseravelmente, tive que chamar meu amigo, e sabe o que foi o mais humilhante? A chave estava no porta chaves do lado da porta.

Saí de lá, peguei um petit taxi (taxi para rodar dentro da cidade) e fui para o lugar que o meu amigo indicou, chegando lá não era o lugar correto, um dos organizadores do ponto de taxi correu comigo até a beira da avenida, parou outro petit taxi, me jogou lá dentro e falou para o motorista para me levar para o ponto do grand taxi para Asilah, como eu sei? Porque "Grand taxi" eles falam em francês e o jeito de falar o nome da cidade eu já tinha decorado do árabe. 

O taxista era um senhor de idade, então nem falei nada com ele, quando cheguei lá entreguei dez dihans, ele me devolveu três. Apontou três taxis e falou algo. Eu fui naquela direção, e os motoristas gritaram "Taxi Asilah", eu acenei com a cabeça e eles abriram a porta para mim, além de mim ainda faltavam mais dois passageiros. Meia hora depois o taxi estava cheio, eram dez da manhã quando o taxi partiu.

Não sei se você conseguiu entender, mas vale aqui um comentário, minha aparência se mistura muito bem no Marrocos, eu aparento ser marroquina, então as pessoas falavam comigo em árabe crendo que eu era de lá. Minha estratégia era falar o menos possível porque como no Brasil, lá para gringo é mais caro. E foi o que eu fiz nesse trajeto.

A viagem até Asilha transcorreu tranquilamente, claro que a paranoia de eu estar indo pra outro lugar ficar pulsando na minha cabeça já imaginando o que fazer para sair do lugar desconhecido e como chegar até a fazenda. 

Ao se aproximar da cidade, o taxi vai contornando o Atlântico, era um dia de sol, as plantas estavam verdes e com flores amarelas, adornando o relevo suave, as rochas eram esbranquiçadas, em tons pastéis leve, bem cara de litoral. Haviam muitas casas de veraneio vazias, hotéis, pousadas, lembre-se era fora de temporada e tempos de corona vírus.

Chegando no centro da cidade, desci do taxi e olhando o google maps logo cheguei na área da velha Medina, antes de entrar fui comer né, porque eu não tinha comido nada. Lembro de ter pedido um tajine de carne e suco de laranja, tajine é comida de almoço e janta, mas já eram onze da manhã então eu podia.

Vista da velha Medina do Porto
Com o buchinho cheio entrei na Medina que também parecia um forte, um muro alto subia da praia, atrás dele muitas construções brancas, e ruelas infinitas. Fiz o trajeto normal onde haviam alguns turistas, fiz algumas fotos com a câmera, mas não tive muito sucesso e logo me senti vigiada, guardei a câmera, acompanhei o grupo de turistas que estavam por lá e quando me senti segura saí andando pelas ruelas.

Eu poderia falar sobre a história da cidade, mas não vou, deixo para outra hora. O que é importante saber sobre essa cidade é que ela é um coração pulsante de arte, nas ruelas haviam inúmeras galerias, artesãos e algumas casas onde as famílias ainda moram. Eu fiquei viajando me imaginando alugar um quarto naquela Medina e amanhecer de frente para o mar com o som das mesquitas chamando para a prece. 

A cidade é realmente espetacular, mas eu estava me lamentando ou me sentindo culpada (olha a terapia piscando aí), porque eu queria mostrar a cidade para tanta gente, compartilhar as descobertas. Enfim, depois de bater perna, achar os cartões postais da cidade para minha coleção, fui andar na praia do lado do porto. Lá fiz uma chamada com as minhas irmãs e mãe, o que aliviou um pouco o incômodo de estar sozinha. 

Na hora de almoçar eu saí da Medina para procurar um restaurante mais barato, encontrei vários e optei por um onde a mesa era externa, mas com uma cobertura que deixava o espaço fresco. Lembro de ter pedido camarão e salada marroquina. Foram realmente muitos camarões. Depois de comer tanto, o cansaço bateu e também me preocupei em chegar na fazenda antes de anoitecer.

Subi em direção ao ponto dos grands taxis, passei no mercadinho, comprei mais chocolate e água. No ponto o motorista já gritava, Larache, Larache, Larache. Subi no taxi sem falar nada, apenas fazendo cara de entender, apenas com gestos. Cheguei em Larache, paguei o taxi e o pai do meu amigo foi me buscar na rodoviária e assim terminou essa super aventura de dias ordinários.


Chega né? Já escrevi demais, um dia vou editar as fotos e tentar colocar elas em melhor qualidade.

Grande abraço

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